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quinta-feira, 2 de novembro de 2017

"Pai, as bruxas existem?". .. / Contardo Calligaris

quinta-feira, novembro 02, 2017


Resultado de imagem para imagem de bruxa de halloweenGarotas têm razão em temer homens que alimentam o ódio do feminino 

 CONTARDO CALLIGARIS 

FOLHA DE SP - 02/11

Disfarçada de bruxa, uma menina de 7 anos deve participar de um arrastão de "doçura ou travessura" no prédio de uma amiga. Ela pergunta: "Pai, as bruxas existem?".


Achando que as bruxas podem ser apavorantes, o pai responde que elas não existem: bruxas são só fantasias para crianças brincarem. A menina insiste: e se aparecer algum adulto que não quer brincar? O pai garante que, na festa, bruxa só será disfarce de criança.

Na verdade, a menina não disse que ela tinha medo das bruxas. Ela perguntou se as bruxas existem e se há adultos que não topam brincar (não necessariamente adultos disfarçados de bruxas). Ou seja, talvez a menina não tenha medo das bruxas, mas, caso ela mesma seja a bruxa de brincadeira, dos "adultos" que não saberiam brincar.

Ela tem razão. Não precisou que as bruxas existissem para que 50 mil mulheres fossem queimadas vivas, enforcadas, afogadas e torturadas ao longo de poucos séculos, que, aliás, terminaram anteontem, menos de 300 anos atrás.

Para os leitores que pedem a lista dos 200 livros imperdíveis: "A Feiticeira" (prefiro "a bruxa"), de Jules Michelet (Aquariana, 2003).


Voltando: O Brasil tem a quinta maior taxa de feminicídio do mundo. Feminicídio não é qualquer assassinato de uma mulher; no ano passado, houve 5.657 registros de mulheres assassinadas, e 533 deles eram feminicídios.

Há feminicídio quando uma mulher é morta por ela ser mulher. A lei do feminicídio (13.104/2015 ) reconhece nele um crime de ódio: trata-se de odiar e matar uma mulher por sua diferença, por ela ser mulher.

Esse ódio do diferente está presente em grande parte da violência contra a mulher: o estuprador, por exemplo, não age por gostar "demais" das mulheres e não conseguir se controlar. O inenarrável deputado Jair Bolsonaro fala como se quisesse estuprar mulheres que acha gostosas. É um erro primário: sem exceções conhecidas, quem estupra odeia a sua vítima (e o feminino em geral).

Enfim, a caça às bruxas foi uma enorme onda de feminicídios, bem na aurora da modernidade. A nossa menina de Halloween tem razão em ter medo –não das bruxas, mas dos (homens) adultos que não brincam e, há 20 séculos, alimentam um formidável ódio do feminino.

Começou com a ideia de que Eva, a tentadora, seria responsável pela desobediência e pela desgraça de Adão. Continuou com a punição que Eva recebeu de Deus: parir com dor e estar sob o domínio do marido.

A literatura feminista mostra de maneira irrefutável, há quase meio século: repressão e ódio do feminino são constantes e talvez até princípios organizadores da nossa cultura.

É engraçado e compreensível que, ao mesmo tempo, o desejo feminino tenha sido idealizado como grande e fascinante mistério (Freud e a psicanálise entraram nessa), porque ele seria, desde aquele início bíblico, o protótipo do desejo sexual que deveria ser recalcado para que Adão e sucessores vivessem em paz.

Qualquer flecha contra essa estranha ordem do mundo é bem-vinda. Chester Brown acaba de publicar uma extraordinária história em quadrinhos, "Maria Chorou aos Pés de Jesus - Prostituição e Obediência Religiosa na Bíblia" (Martins Fontes).

Ele reconstrói as histórias de personagens que conhecemos bem: Caim e Abel, Tamar, Raabe etc., até Maria, mãe de Jesus. Só aos poucos nos damos conta das pequenas distorções que Brown introduz, sempre para mostrar outra possibilidade de situar o desejo feminino na história.

A coisa desabrolha quando Brown explica a suposta virgindade de Maria como uma maneira oculta de contar que Maria era promíscua e não saberia de quem Jesus seria filho – entendendo que a promiscuidade seria originalmente um traço positivo de várias figuras femininas do Antigo Testamento: figuras fortes, livres, cujo desejo não seria submisso ao do homem.

Mesmo que você se indigne com tanta "ousadia", não desista. Os quadrinhos são acompanhados de notas e referências bibliográficas preciosas: Chester Brown conhece a história bíblica, suas variantes, suas interpretações possíveis e sua exegese. Perder-se nos livros que ele cita, aliás, é sumamente interessante.

E, sobretudo, lembre-se: a de Brown é uma empreitada desesperada contra séculos de repressão cultural. Desesperada, mas portadora de uma grande esperança: a de que uma menina, no dia de Halloween, não precise ter medo de ser menina e de se vestir de bruxa.

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

"Uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil..." / G1

Uma mulher é assassinada  a cada duas horas no Brasil; estupros aumentaram 3,5% em 2016

Mato Grosso do Sul tem maior taxa de morte de mulheres e estupros por 

100 mil habitantes, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Por Cíntia Acayaba, G1 SP
 
Ato Público em Repúdio ao Feminicídio na Secretaria da Justiça (Foto: Renato S. Cerqueira/Futura Press/ Estadão Conteúdo )Ato Público em Repúdio ao Feminicídio na Secretaria da Justiça (Foto: Renato S. Cerqueira/Futura Press/ Estadão Conteúdo )
Ato Público em Repúdio ao Feminicídio na Secretaria da Justiça (Foto: Renato S. Cerqueira/Futura Press/ Estadão Conteúdo )
Uma mulher foi assassinada a cada duas horas em 2016 no Brasil, segundo levantamento feito pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado nesta segunda-feira (30). No ano passado, o Brasil atingiu o recorde de assassinatos: 61.619.
Em números absolutos, 4.657 mulheres perderam a vida no país. Apesar disso, apenas 533 casos foram classificados como feminicídios mesmo após lei de 2015 obrigar registrar mortes de mulheres dentro de suas casas, com violência doméstica e por motivação de gênero.
“Temos que ter uma rede ampla de atendimento para a mulher. Esse é um dos motivos para a subnotificação tão grande de feminicídios. O crime é o desfecho fatal de uma série de violências”, diz Olaya Hanashiro, consultora-sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Para a diretora-executiva da entidade, Samira Bueno, a presença de mulheres nas polícias é muito baixa, o que também prejudica o número de registros. “Não faz sentido ter uma corporação com 90% de homens e 10% de mulheres”, diz.
O presidente da Associação Nacional dos Praças (Anaspra) e integrante do Fórum, Elisandro Lotin, completa dizendo que as poucas policiais ainda sofrem assédio sexual e moral nas instituições.
O Mato Grosso do Sul é o estado com maior taxa de mortes de mulheres do país: 7,6 por 100 mil habitantes - 102 mulheres foram assassinadas no estado no ano passado, aumento de 22,9% se comparado ao ano anterior.
O Pará é o segundo estado com maior morte de mulheres proporcionalmente, com taxa de 6,8 por 100 mil habitantes, seguido pelo Amapá.

Estupros

O número de estupros cresceu 3,5% no país e chegou a 49.497 ocorrências em 2016. A taxa por 100 mil habitantes é de 24.
Mato Grosso do Sul também é o estado com maior taxa de estupros: 54,4 por 100 mil habitantes, com 1.458 crimes. Na sequência, estão Amapá, com taxa de 49,2 estupros e Mato Grosso, com 48,8.
De acordo com Daniel Cerqueira, diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia do Ipea e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a estimativa de órgãos de saúde é de que cerca de 500 mil mulheres são estupradas no país por ano.
"São casos que não chegam à delegacia. Quando vemos a baráarie desses números é porque boa parte do que acontece ninguém vê. Violência doméstica e estupro são tabu no Brasil.
"É uma grande tragédia porque a sociedade é vitimada. A linguagem da violência se dissemina da casa para rua. Pensar em políticas que se fala no gênero nas escolas é fundamental. Ainda estamos na ideia de que só colocar polícia na rua resolve as coisas", completa.
No total, há 443 delegacias especializadas de atendimento à mulher. A taxa é de 0,4 delegacias por 100 mil mulheres. O Tocantins, com 13 delegacias, é o estado com melhor média de delegacias para cada mulher: 1,7 por 100 mil mulheres.

Lei Maria da Penha

Um projeto de lei aprovado no Congresso aprovado no último dia 10 altera a Lei Maria da Penha. A secretária de Direitos Humanos da Presidência da República, Flávia Piovesan, afirmou ao G1 que vai recomendar ao presidente Michel Temer o veto. O parecer pelo veto atende a pedidos de entidades de direitos humanos e ligadas ao Judiciário.
Se sancionada por Temer, a mudança vai permitir que delegados concedam medidas protetivas de urgência a vítimas de violência doméstica. Atualmente, apenas os juízes podem determinar o afastamento do agressor do lar ou do local de convivência com a vítima. Segundo entidades, a mudança tornaria a lei inconstitucional.
Em entrevista concedida ao G1, Flávia Piovesan afirma que a mudança representa um "retrocesso aos direitos das mulheres". Segundo a secretária, o papel de concessão "cabe ao [Poder] Judiciário", e a Polícia Civil "não tem estrutura adequada para assumir essa tarefa".

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

"A vlolência contra a mulher é uma epidemia" > Silvia Chakian em Época


Silvia Chakian: “A violência contra a mulher é uma epidemia”

Para a promotora, a violência contra o sexo feminino não distingue classes. “É um fenômeno tragicamente democrático”

CRISTINA GRILLO
30/01/2015 19h16 - Atualizado em 30/01/2015 19h48


O feminicídio é a última instância do controle da mulher (Foto: Divulgação)
Na primeira década do século XXI, 50 mil mulheres foram assassinadas no Brasil –uma morte a cada hora e meia. Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) afirma que grande parte desses homicídios foi consequência de atos de violência doméstica ou familiar, já que cerca de um terço deles aconteceram no domicílio das vítimas. A punição contra este tipo de crime, chamado feminicídio, pode se tornar mais dura caso a Câmara Federal aprove um projeto de lei que o inclui no Código Penal e entre os crimes considerados hediondos. Assim, os condenados pela morte de mulheres poderão ter suas penas aumentadas de um terço até a metade da punição determinada. “É um fenômeno tragicamente democrático, atinge mulheres de todas as classes sociais”, diz a promotora Silvia Chakian, coordenadora do Gevid (Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica) do Ministério Público de São Paulo e defensora da inclusão do feminicídio na legislação brasileira.
ÉPOCA – A lei Maria da Penha, em vigor há nove anos, não diminuiu a violência contra a mulher?
SILVIA CHAKIAN – 
Houve avanços, rompeu-se o padrão de ver a violência como algo comum, mas não houve redução nos índices. Ainda que haja uma diminuição do total de homicídios no Brasil, não aconteceu a mesma coisa no caso das mulheres. É uma epidemia mesmo.
ÉPOCA – Como se caracteriza o feminicídio?
SILVIA CHAKIAN
 É um homicídio em que a questão do gênero tem grande importância. Grande parte dos casos acontece dentro de casa, com mortes causadas por parceiros que têm sobre as vítimas um poder de dominação, de hierarquia. O feminicídio é a última instância do controle da mulher.
ÉPOCA – Nos anos 80, advogados costumavam usar a tese da legítima defesa da honra para defender homens acusados de matar suas mulheres. Essa tese ainda é usada nos tribunais?
SILVIA CHAKIAN – 
Infelizmente, a essência da tese continua a ser usada nos plenários. Ainda há longas discussões a partir de estereótipos, como atribuir à vítima a culpa pelo crime, questionar sua fidelidade, argumentar que ela se recusara a manter relações. A tese continua lá, mas com outra roupagem. Ainda há quem fale em crime de amor
ÉPOCA – Atos de violência contra mulheres têm maior incidência em alguma classe social?
SILVIA CHAKIAN – 
Infelizmente é um fenômeno tragicamente democrático, que atinge todas as classes.  E muitas vezes a mulher não se enxerga como vítima, nem o homem se vê como agressor.