Mostrando postagens com marcador Zuenir Ventura. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Zuenir Ventura. Mostrar todas as postagens

domingo, 27 de novembro de 2016

Brasília em transe / Zuenir Ventura

Brasília em transe

Pense em um deputado, senador, ministro, ex-ministro, presidente, ex-presidente, e ele pode estar nessa ‘blacklist’. A sensação é de que quase ninguém está a salvo
Crise política (Foto: Arquivo Google)
Zuenir Ventura, O Globo
Está no seu DNA, é crônico. Brasília não consegue viver sem crise. Mal se livra de uma, surge outra. O alívio às vezes é temporário, como aconteceu esta semana, quando parecia superado o episódio que envolveu o ministro Geddel Vieira, responsável pela renúncia de seu colega da Cultura, que o acusou de pressioná-lo para atender a interesses escusos.
Apesar da grave denúncia, Geddel continuou merecendo a confiança do presidente e ainda recebeu um manifesto de apoio de líderes da base aliada no Congresso. Um final feliz, até que se tornou público o depoimento de Marcelo Calero à PF acusando o presidente Temer e o ministro Eliseu Padilha de o terem pressionado e “enquadrado” em favor do amigo e auxiliar de confiança.
Para piorar, desconfiado de que Calero tenha gravado a conversa, o presidente teria pedido a Geddel sua saída, o que acabou acontecendo ontem. Na carta de demissão, ele afirma que tomou a decisão “diante da dimensão das interpretações dadas e do sofrimento dos meus familiares”. Antes de conhecer o desfecho, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, se precipitara: “Esse Calero enlouqueceu”.
Agora, a melhor maneira de saber quem de fato enlouqueceu é descobrir o que contém a suposta gravação. Por algum tempo, o governo e a classe política puderam dormir mais tranquilos ao saber que ficou suspensa até segunda-feira a assinatura do acordo de colaboração dos 76 executivos da Odebrecht com a Operação Lava-Jato.
Chamada de “mãe de todas as delações” ou de “operação do fim do mundo”, essa delação citaria mais de cem políticos como tendo recebido algum agrado em forma de propina da “mãe de todas as empreiteiras”. Pense em um deputado, senador, ministro, ex-ministro, presidente, expresidente, e ele pode estar nessa blacklist.
A sensação é de que ninguém, ou quase ninguém, está a salvo. Daí a mobilização dessa espécie de frente ampla parlamentar para combater os que combatem a corrupção, comandada no Senado por seu presidente, Renan Calheiros (12 inquéritos no STF), e pelo líder do governo, Romero Jucá (oito inquéritos no STF), o tal que já defendeu um “pacto para estancar a sangria”.
A ofensiva se esconde atrás de vários disfarces, como a emenda que, na prática, segundo o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima, visa a “anistiar a corrupção”, atingindo diretamente a Lava-Jato. Ele afirma que essas e outras iniciativas têm como objetivo criar um “salvo-conduto geral para corruptos de todo o país”.
Em poucas palavras, o alvo dessa escandalosa articulação tem um símbolo de quatro letras: Moro. Um atentado ao seu trabalho pode deixar não apenas Brasília, mas o Brasil em transe
Zuenir Ventura é jornalista

quarta-feira, 26 de outubro de 2016

E agora Rio de Janeiro...? O dinheiro acabou, a esperança se escondeu, a política baixou o nível de credibilidade...?

Uma encrenca carioca

Para acirrar os ânimos e baixar o nível, tem aumentado a troca de ofensas pessoais que, além de confundir os eleitores, mostra as fragilidades de Freixo e Crivella
Rio de Janeiro pós Olimpíadadas (Foto: Arquivo Google)
Zuenir Ventura, O Globo
A s más notícias não cessam de perseguir o Rio depois da Olimpíada. Já não se fala nem da violência urbana, velha rotina que tende a aumentar com a saída do governo de José Mariano Beltrame, uma esperança perdida.
Além disso, antes mesmo de terminados os Jogos, o governador em exercício Francisco Dornelles decretou “estado de calamidade pública”, diante da iminência de “total colapso na segurança pública, na saúde, na educação, na mobilidade e na gestão ambiental”.
O motivo alegado foi a queda da arrecadação do ICMS e dos royalties do petróleo. Os efeitos dessa providência continuam a aparecer nas primeiras páginas dos jornais. Ontem, soube-se que o projeto de orçamento do governo estadual para 2017 prevê um rombo de R$ 15,3 bilhões.
E que 26 empreiteiras culpam a prefeitura pela paralisação de obras por suposta dívida de R$ 700 milhões. O pior é que as perspectivas para a cidade não são animadoras. A cada dia surgem revelações de deslizes de um e outro candidato à sucessão de Eduardo Paes.
A acusação mais recente é a de que Marcelo Freixo nomeou sua ex-mulher no gabinete do partido na Câmara dos Vereadores; e Marcelo Crivella teria feito coisa parecida no Senado com a mãe de uma assessora.
Para acirrar os ânimos e baixar o nível, tem aumentado a troca de ofensas pessoais que, além de confundir os eleitores, mostra as fragilidades de ambos. No quesito xingamento, o pastor está ganhando a disputa, ao exibir seu imbatível repertório verbal.
Ao lado dos termos com que premiara o adversário — “não vou dizer que você é safado, canalha, vagabundo, o povo vai dizer isso nas urnas” — ele guardou alguns como “patifes”, “patetas” e também “vagabundos” para os jornalistas que desmascararam seus malfeitos do passado.
Com a autoridade de quem passou pela política moralmente incólume, Fernando Gabeira fez uma primorosa análise do impasse em que se encontra o eleitor carioca: “Entre a cruz e a espada”, ou seja, entre um fundamentalismo religioso e outro político.
No primeiro caso, ele se refere ao livro em que o autor demoniza religiões que não a sua; e no segundo, ele lembra dois episódios emblemáticos: o ataque ao Prêmio Nobel da Paz, Shimon Peres, chamado no site do PSOL de “genocida”, e a queima da bandeira de Israel por um dirigente do partido de Freixo.
Por isso, ele se dá o direito de afirmar, e eu concordo: “Assim como a suspeita de obscurantismo religioso é razoável no contexto de Crivella, a do obscurantismo político também é razoável no da extrema-esquerda”.
Como é que o carioca, que se acha tão esperto, foi se meter numa encrenca dessas?
Zuenir Ventura é jornalista

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Uma eleição para um eleitorado desconfiado, sem motivação / Zuenir Ventura

Como reverter o desencanto?

Não será recorrendo ao evangelho ou ao ‘Fora Temer’ que Crivella e Freixo resolverão nossas mazelas
Marcelo Crivella e Marcelo Freixo (Foto: Arquivo Google)
Zuenir Ventura, O Globo
Serão quatro semanas decisivas para os próximos quatro anos de uma cidade cujos problemas dois Marcelos dirão como pretendem resolver, um pela direita e o outro pela esquerda. Mas como não se governa com bandeiras — nem evangélica nem ideológica — e sim com programas, o novo prefeito terá que ter a humildade e a competência administrativa de um síndico, não a retórica de um parlamentar.
Crivella, com 27,7%, e Freixo, com 18,2%, devem estar cheios de si com a vitória que obtiveram sobre nove adversários cada um. Só que a soma de seus votos por pouco não é suplantada pelos não votos, ou seja, por 42,4% dos eleitores que não votaram ou votaram em branco e nulo. Como reverter isso?
Entre os dois há em comum a declarada recusa ao PMDB, pelo menos por enquanto, já que o eleito terá que se relacionar com o presidente e com o governador, ambos do partido. No discurso da vitória, Freixo chegou a classificar a agremiação de “golpista”. Mas não sei se muitos dos que votaram nele não teriam preferido ouvi-lo falar do seu plano de governo, em vez de ficar repetindo que é contra o “golpe” e que sua vitória é “representativa” de sua posição. Será?
Como se explica então o desempenho de Crivella, que foi ministro de Dilma e votou a favor do impeachment? E o que isso tem a ver com o Rio? Não será recorrendo ao evangelho ou ao “Fora Temer” que resolverão nossas mazelas. É verdade que já no dia seguinte eles amanheceram mais realistas e voltados para o campo da centro-direita.
Crivella, mesmo mantendo “imensas restrições” às lideranças do PMDB, vai procurar vereadores do partido como Rosa Fernandes e Jairinho. E, claro, pretende conquistar os eleitores de Osorio, Indio e Bolsonaro, que ele acredita terem mais afinidade com suas ideias. Freixo, por sua vez, mostrou-se disposto a conversar com o candidato do PSDB, Carlos Osorio, e com Indio, do PSD.
“Segundo turno não é alianças”, disse, “é apoio”. Ele acredita que pode conquistar até parte dos votos de Flávio Bolsonaro, que se situa no lado oposto. O candidato da esquerda acha que há um voto do candidato mais à direita “também ético, não só ideológico”. Além disso, os dois Marcelos vão tentar reciclar aspectos negativos de suas imagens — Crivella, descolando-a da igreja do bispo Macedo; e Freixo, de um certo anarquismo black bloc.
Em suma, vai ser uma campanha polarizada e cheia de contradições, e uma “nova eleição”, como se diz do segundo turno. As estratégias serão diferentes, mas o alvo é o mesmo: 2,4 milhões de eleitores, dos quais mais de 1 milhão não compareceram às urnas ou desperdiçaram seu voto no primeiro turno, expressando de uma maneira ou de outra seu desinteresse ou desencanto pela política.
Marcelo Crivella e Marcelo Freixo (Foto: Arquivo Google)
Zuenir Ventura é jornalista

quarta-feira, 20 de julho de 2016

"Êta mundo ruim.." // Zuenir Ventura

Êta mundo ruim

A pior novidade é que agora estão procurando exportar para nós terrorismo e outras mazelas, como se as nativas não fossem suficientes
Zuenir Ventura, O Globo
Podia ser pior, podia ser a França dos atentados terroristas, a Turquia da tentativa de golpe de Estado com mais de 200 mortos, os Estados Unidos dos eternos conflitos raciais ou mesmo a Venezuela dos milhares de habitantes atravessando a fronteira para comprar alimentos e medicamentos.
Fanatismo (Foto: Arquivo Google)
Essas tragédias distantes não nos servem, porém, de consolo nem querem dizer que devemos ficar satisfeitos com a nossa crise, com os nossos quase 60 mil homicídios por ano e com uma situação como a do Rio, onde, em 72 horas da semana passada, balas perdidas deixaram três mortos e 12 feridos, em episódios de violência que viraram rotina.
É apenas uma lembrança para aqueles que acham que a solução é deixar o país. Como já escrevi aqui, não há mais Pasárgada, aquele lugar mítico, paradisíaco, onde Manuel Bandeira sonhava em se refugiar e, com essa viagem onírica, compôs um dos mais populares e bonitos poemas de evasão.
Tuberculoso, o poeta achava que lá faria tudo a que não tinha direito: andaria de bicicleta, montaria em burro brabo, faria ginástica, subiria em pau de sebo. Pasárgada era uma cidadezinha nas montanhas do sul da Pérsia onde é hoje o Irã, um país carregado de tensões.
A pior novidade é que agora esse mundo está procurando exportar para nós suas mazelas, como se as nossas, as nativas, não fossem suficientes — com a agravante de que são pragas desconhecidas aqui, como o terrorismo e o fundamentalismo religioso. Protegidos pela distância, olhávamos para lá com espanto, mas sem medo e até com um certo alívio: “Pelo menos disso estamos livres”.
No entanto, uma ONG internacional que monitora ações terroristas na internet acaba de descobrir que existe uma organização extremista fiel ao abominável Estado Islâmico enviando ameaças, uma das quais diz que, se a França não conseguiu impedir os ataques recentes, “o treinamento dado à polícia brasileira não conseguirá”.
Mais grave ainda: já existiriam brasileiros “preparados para o sacrifício de se tornarem mártires”, a exemplo do que está acontecendo com milhares de jovens europeus, que partem para as fileiras do EI na Síria e no Iraque, trocando suas vidas pela “causa”. Os atentados ocorreriam durante os Jogos Olímpicos, que vão atrair o olhar do planeta.
É preciso, porém, considerar que uma das armas do terrorismo que vem sendo praticado pelo Estado Islâmico é a propaganda, é a criação de uma expectativa de medo e pânico. De qualquer maneira, o sistema de segurança da Olimpíada deverá montar um esquema cujo aparato não provoque uma paranoia coletiva e, ao mesmo tempo, ofereça à população uma sensação de tranquilidade.
Zuenir Ventura é jornalista

sábado, 19 de março de 2016

Quantas máscaras Lula usa para se comunicar? Contei algumas :há a de comícios; a de telefonemas; a de carta aberta ao povo; para palcos da militância...Acho que existem mais !

Lula com e sem asteriscos

A conversa com o deputado federal Wadih Damous exigiria quatro: “filho da p(*)”, “m(*)” e duas vezes “fo(*)-se”
Já que quase tudo foi dito e publicado sobre o conteúdo das gravações de Lula, cujos efeitos agitaram ainda mais o ambiente político, vou me limitar à forma, isto é, à incontinência verbal que atentou contra o bom gosto e os bons modos de linguagem.
Palavrão (Foto: Arquivo Google)Ouvindo os áudios e lendo as transcrições, me lembrei do recurso inventado pelo “Pasquim” para driblar a censura e evitar inconveniências vocabulares: o asterisco (*). A famosa entrevista da atriz Leila Diniz, em 1969, teve enorme repercussão, menos pelo que foi mostrado e mais pelo que foi sugerido.
O sinal gráfico substituía os palavrões, cabendo ao leitor usar a imaginação e adivinhar o que vinha encoberto, e isso era mais delicado do que a revelação com todas as letras. No registro do desabafo telefônico de Lula para Dilma, por exemplo, não se reproduziria as duas letras e sim: “Eles que enfiem no (*) o processo”. Ou então: “... que enfiem no c(*).” Afinal, a liturgia do cargo exige um mínimo de respeito.
Para Leila, foram usados mais de 70 asteriscos. Lula não chegou a tanto, mas, mesmo assim, foi um número excessivo para rápidos diálogos muito pouco republicanos e nada edificantes. A imprensa se dividiu quanto à maneira de tratar o problema.
Como um palavrão ouvido é muito mais forte do que lido, a televisão usou um sinal sonoro para apagar as expressões chulas. Já os impressos preferiram mostrar Lula sem retoque — sem asteriscos.
De minha parte, confesso que, menos por recato ou pudicícia, e mais por gosto estético, ainda não me acostumei com esse exagerado liberou geral atribuído à influência do vale-tudo da desbocada internet.
Se tivesse que transcrever aqui o telefonema do ex-presidente para o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, eu usaria dois asteriscos: um “filhos da p(*)” e um “que po(*) é essa?”. A conversa com o deputado federal Wadih Damous exigiria quatro: “filho da p(*)”, “m(*)” e duas vezes “fo(*)-se”.
O papo com o deputado José Guimarães, líder do governo na Câmara, merece três: “Cara (*), “po(*) e f (*)dendo”. Com Rui Falcão, presidente do PT: “eu quero que se fo(*). E o nosso prefeito, hein, competindo com Lula em palavrões. Ele desculpou-se publicamente alegando que foram “brincadeiras de mau gosto”. Como ele mesmo diria, “p(*) que me pariu”, que brincadeiras.
Quanto a Lula, se o ser humano revela o pensamento pela linguagem, suas falas com todas as letras, sem asteriscos, mostram o que se passa em sua cabeça.
Quando o tema parecia esgotado, eis que surge Dona Marisa ao telefone com o filho Lulinha, dizendo, depois de um panelaço: “Eles que enfiem as panelas no (*)”.
Deve ser um lugar-comum familiar.

  • TAGS:

sábado, 10 de outubro de 2015

“Hoje, a Câmara fede. Daqui a pouco, vai apodrecer.”, Jarbas Vasconcelos


Localizando o mau cheiro

Jarbas Vasconcelos não entende como pode oposição confiar em Cunha, que mente sobre contas na Suíça, já confirmadas pela Procuradoria
Mau cheiro (Foto: Arquivo Google)
Tantas concessões, tanta entrega, tanto toma lá dá cá, tanta nomeação infeliz, terá valido a pena para a presidente a tal reforma ministerial? Parece que o próprio Planalto estaria reconhecendo que não, diante de uma semana de dificuldades e derrotas.
O TCU recomendou a rejeição das contas de 2014 do governo, o TSE reabriu investigação sobre a campanha de Dilma e Temer, e o governo não conseguiu quorum no Congresso para os vetos presidenciais.
Assim, a crise prossegue num estilo de telenovela, com a diretora-protagonista se complicando a cada capítulo e, sem saber o que fazer, dando razão à grosseria de Delfim Netto, que disse ser ela “simplesmente uma trapalhona”, como se ele não tivesse feito também suas trapalhadas quando ministro dos militares.
Mas, enfim, este é o país da amnésia crônica. Voltando ao espetáculo, anteontem, ela reuniu todo o elenco para cobrar fidelidade dos aliados no Congresso e para denunciar que está em curso no país um “golpe democrático à paraguaia”.
O personagem mais intrigante desse folhetim é aquele que seu correligionário do PMDB Jarbas Vasconcelos chama de “doente, psicopata, um cínico”: é o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
Em entrevista a Josias de Souza, o deputado pernambucano se diz “estarrecido” com a aliança firmada pela oposição com Cunha para facilitar o processo de impeachment. Ele não entende “como confiar numa pessoa que mente sobre contas bancárias na Suíça, já confirmadas pela Procuradoria”.
De fato, documentos do Ministério Público suíço não deixam dúvidas: as quatro contas do banco Julius Baer têm o nome e o endereço de Cunha na Barra da Tijuca, sendo que duas foram fechadas um mês depois do início da Lava-Jato. Nas duas que continuaram ativas, as autoridades bloquearam US$ 2,5 milhões.
Enquanto isso, Eduardo Cunha continua negando ter dinheiro depositado no exterior ou se recusando a falar sobre o assunto, sem explicar as coincidências que envolvem seu nome. Ao contrário do PSDB, cujo líder Carlos Sampaio alegou o “benefício da dúvida” para não agir contra Cunha, o PSOL não teve dúvida em anunciar que pedirá ao Conselho de Ética abertura de processo de cassação do presidente da Câmara.
Mas Jarbas Vasconcelos acredita que Cunha só correrá riscos se a reação contra ele adquirir consistência e força. “Ou essa coisa se avoluma, ganhando a forma de um movimento sério e contundente, ou o problema vai se arrastar”. E, para descrever a situação moral da Casa presidida por Cunha, ele não usa eufemismos: “Hoje, a Câmara fede. Daqui a pouco, vai apodrecer.”

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Fogueira de vaidades...! "Terá valido a pena?" / Zuenir Ventura

Enviado por Ricardo Noblat - 
6.11.2013
 | 16h16m
GERAL

Terá valido a pena?, por Zuenir Ventura

Zuenir Ventura, O Globo
Fui cobrado por ter escrito há 15 dias que a polêmica sobre as biografias “já deu o que tinha que dar” e que ninguém mais iria convencer ninguém que já não estivesse convencido. Como, parodiando Machado de Assis, “sofro de tédio à controvérsia”, quando elas viram bate-boca, propunha que se aguardasse então a decisão da Justiça.
Estava enganado, as discussões continuaram e ficaram ainda mais acirradas. Esqueci que no Brasil polêmica acaba em polêmica, isto é, não acaba, uma dá início a outra, como agora, com a aparente mudança de posição do Procure Saber e o real racha entre seus integrantes.
A novidade é a transferência das divergências para o âmbito dos próprios membros do grupo, a julgar pelo que tem vazado para a imprensa. Zózimo Barroso do Amaral noticiaria assim: “Não convidem para a mesma mesa Roberto Carlos e Caetano Veloso”.
Essa parceria foi responsável por um dos momentos mais emocionantes da música brasileira, quando o Rei foi visitar Caetano no exílio de Londres, em 1970, e de lá saiu com inspiração para a bela canção-homenagem “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos”.

                                                         Caetano Veloso e Roberto Carlos

Porém, em termos de ação política conjunta, é difícil a dupla ter futuro. De um lado, o Rei, um moita, cheio de segredos, mistérios e cismas. De outro, Caetano, transparente, franco, expansivo, exibido e sem papas na língua.
O desacordo interno surgiu com a destituição de Paula Lavigne como porta-voz do grupo e sua substituição por um hábil advogado da confiança de Roberto, junto com um “gerenciador de crises” para orientar o “vídeo do recuo”.
A partir de uma experiência pessoal, acho que foi uma injustiça. A culpa pelo ruído entre os dois e pela desunião da turma não deve ser atribuída a Paula, que, apesar da fama, é mais conciliadora do que briguenta (peço licença para uma revelação: Caetano ficou 15 anos sem falar comigo por causa do “1968”. Um dia, ela pegou os dois pelas mãos, disse “Vamos deixar de viadagem” e jogou um nos braços do outro).
Discute-se agora para descobrir se a nova posição do Procure Saber é uma disfarçada confissão de derrota, um recuo estratégico em face da desaprovação da sociedade (também a Academia Brasileira de Letras decidiu apoiar no STF a ação dos editores de livros) ou se, como advertiu Merval Pereira, é uma proposta mais perigosa do que a anterior porque contém um maquiavélico “efeito colateral”, capaz de amordaçar por extensão a imprensa.
Rompendo um demorado silêncio, Roberto Carlos criticou publicamente a “posição mais radical” adotada até então. Poderia então, já que se mostra menos radical, aceitar a sugestão do editor Roberto Feith e retirar a proibição ao livro sobre ele. O que pensam os colegas sobre o discurso do novo porta-voz?
Até agora, essa aliança de artistas deixou como saldo imagens arranhadas e relações estremecidas, sem falar no estigma de ter trazido à cena o fantasma da censura prévia. Terá valido a pena tanto desgaste, inclusive para as biografias dos envolvidos? O objetivo não era preservá-las?

Zuenir Ventura é jornalista.


quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Desobediência do AfroReggae ao tráfico traz novidade na relação do crime com a lei vigente


Enviado por Ricardo Noblat - 
7.8.2013
 | 9h15m
GERAL

Dizendo não ao tráfico, por Zuenir Ventura

Zuenir Ventura, O Globo
Uma das diferenças entre a ditadura militar dos anos 60/70 e a do narcotráfico de agora é que contra aquela ainda havia lugar para algum tipo de contestação, embora com risco; já esta não permite qualquer desobediência a suas ordens.
Toda oposição é castigada com tortura e execução. Por isso, assume caráter inédito a resistência do AfroReggae e de seu coordenador, José Junior, à pressão exercida pelos traficantes do Complexo do Alemão e da Penha por meio de ameaças de morte e vários atentados a prédios da entidade, comandados à distância, ao que tudo indica, por dois dos mais perigosos bandidos do estado: Fernandinho Beira-Mar e Marcinho VP, que cumprem pena na penitenciária de segurança máxima de Catanduvas, no Paraná.
Como chama a atenção o próprio Junior, "o importante nessa história é que pela primeira vez uma instituição não acata uma ordem do narcotráfico". O exemplo não é só o dele, mas também dos “jovens e idosos que, mesmo contra a proibição ao AR, participam das nossas atividades”.
Novidade também é o movimento que começou a se organizar na semana passada, quando cerca de 100 pessoas representando vários segmentos sociais se reuniram para criar uma espécie de "rede de proteção" simbólica a José Junior, que vem sofrendo ameaças de morte e se recusa a deixar o país, apesar do convite de organizações internacionais e do conselho de amigos e autoridades.

José Juniorcoordenador do AfroReggae

Ressaltou-se também a importância de a sociedade assumir o projeto de pacificação como uma política de Estado, a ser mantida mesmo com mudanças de governo. Graças às UPPs, morrem hoje no Rio menos mil pessoas a cada ano.
Na ocasião, dois jovens da periferia deram seu depoimento: o de uma comunidade pacificada disse que havia muita coisa a fazer, mas que ninguém desejava a volta ao passado; o outro afirmou: "Queremos a pacificação. Nada ganhamos sob o domínio dos traficantes."
A partir do encontro, que discutiu formas de solidariedade a serem adotadas, o movimento se estendeu à internet e está recebendo dezenas de e-mails de adesão. O primeiro evento programado é o Concerto para a Paz, da Orquestra Sinfônica Brasileira, no próximo dia 19, no Teatro Municipal. José Junior acredita que com o apoio da sociedade e do governo “podemos vencer essa guerra, aliás, já estamos vencendo”.
Ele não hesita em defender a política de pacificação, discordando dos que veem nos atentados um sintoma de enfraquecimento do projeto das UPPs. Ao contrário: "Os tiros não foram um sinal de força, e sim de fraqueza"

Zuenir Ventura é jornalista.


quarta-feira, 31 de julho de 2013

Banalização do Bem versus Banalização do Mal // Zuenir Ventura

Enviado por Ricardo Noblat - 
31.07.2013
 | 
09h15m
GERAL

Banalização do Bem, por Zuenir Ventura

Zuenir Ventura, O Globo


Nesses tempos sombrios de violência, guerra, miséria e fome, em suma, da chamada banalização do Mal, é sintomático que o Papa Francisco tenha conseguido um extraordinário sucesso pregando justamente o contrário, algo como a banalização do Bem.


A sua foi a primeira voz autorizada de alcance planetário a se levantar contra a razão cínica em voga, propondo em seu lugar um círculo virtuoso, uma espécie de revolução ética contra a cultura do provisório, da exclusão e do descartável.


Quem sabe ele não estará pondo fim a um ciclo de produção do mal como energia incontrolável? O filósofo francês Jean Baudrillard, estudioso do tema e cético quanto à sua erradicação, achava inevitável o funcionamento das sociedades sobre a base da “disfunção, do acidente, do catastrófico, do irracional”. Na sua opinião, “dizer que tudo isso pode ser exorcizado, erradicado, significa insistir numa perspectiva religiosa da salvação”.


Pois durante a semana que passou entre nós, foi nessa perspectiva que o Papa insistiu, distribuindo esperança e atualizando antigos valores e virtudes como a solidariedade e a tolerância, esquecidos ou “fora de moda”.


Ele pode até ser criticado pelo que calou (aborto, preservativo, célula-tronco), mas não pelo que falou de outros temas tabus: “Se uma pessoa é gay, quem sou eu para julgá-la?” “A mulher na Igreja é mais importante que os bispos e os padres”.


A maior novidade de seu discurso inovador é que a reforma moral proposta por ele deve passar pelo diálogo e o encontro, não pelo confronto. Pela compreensão, não pela animosidade. Nunca pela intransigência e o radicalismo. Essa talvez seja a melhor contribuição para a paz do evangelho segundo Francisco.


Ao facilitarem o trabalho dos garis ajudando a recolher o lixo depois dos eventos, os peregrinos deram uma lição de educação para os foliões sujismundos e mijões, que no carnaval espalham detritos nas ruas e urinam nas calçadas, canteiros e até através das grades dos edifícios. Mais um legado de civilidade deixado pelos alegres fiéis da JMJ.


Por falar em onda do bem: o Instituto do Cérebro Paulo Niemeyer, que está sendo inaugurado, impressiona não só porque é um dos mais bem instalados e equipados do mundo, mas também por ser uma obra “padrão Papa”, ou seja, é excelente e não se destina aos privilegiados, e sim aos necessitados do SUS. E pensar que, com o que foi gasto com muitos dos estádios que vão virar elefantes brancos depois da Copa, algumas dezenas desses hospitais podiam ser construídos pelo Brasil afora.











sábado, 4 de agosto de 2012

Aguardando os 'finalmentes', mas sem confiança ou interesse

Enviado por Ricardo Noblat - 
04.08.2012
 | 
14h03m
GERAL

À espera dos finais, por Zuenir Ventura

Zuenir Ventura, O Globo
Dois sucessos do momento continuarão em cartaz por cerca de mais um mês, mantendo o público em suspense sobre o final. Quem não está interessado em descobrir como vai terminar “Avenida Brasil” e quem não quer saber qual será o desfecho do julgamento do mensalão? Que destino terão Carminha e Nina? O que acontecerá com José Dirceu? Pra só falar dos personagens principais.
Com “Primo Basílio”, Eça de Queirós tinha a “ambição de pintar a sociedade portuguesa” do fim do século XIX, composta por uma burguesia que ele considerava decadente. Não se sabe se, com sua novela livremente inspirada naquele romance, João Emanuel Carneiro tem também a pretensão de refletir o país da CPI do Cachoeira e dos mensaleiros.
De qualquer maneira, pode-se estabelecer alguma analogia entre o clima moral do folhetim e o da realidade política atual, nos quais predominam boas doses de cinismo, mentira e hipocrisia. A diferença é que no folhetim quase todo mundo age um pouco como vilão; em Brasília, todos se esforçam para parecer inocentes mocinhos, inclusive os vilões.
Eça construiu uma trama que levou Luísa, a patroa adúltera, a sucumbir à tortura psicológica imposta por Juliana, a empregada, que descobre cartas de amor entre os amantes e com elas vai chantagear sua vítima até a morte por medo, culpa e desespero.
João Emanuel repete o esquema, mas faz de Nina uma Juliana muito mais perversa e, de Carminha, uma Luísa menos frágil e ingênua, e que está mais disposta a matar a chantagista do que morrer de desgosto.
Já Max é um canalha ainda mais bandido do que Basílio, que, segundo Eça, era “antes um pulha pobre, depois um pulha rico”.
Ao contrário, porém, do que se passa no romance e na novela, onde abundam provas materiais (cartas num caso e fotos no outro), no espetáculo que começou a se desenrolar no STF esta semana a defesa alega que há falta delas para produzir uma justa condenação. Será?
Será que daqui a 20 anos vamos ter no Senado 38 novos Collors? Ou 20? Que seja apenas um? Será que vão prevalecer as chamadas razões técnicas (ou seriam razões cínicas?).
Se isso acontecer, não se sabe como reagirá uma sociedade saturada pela corrupção e pela impunidade, e cansada dos escândalos e da “falta de provas”. Afinal, os tempos são outros.
O Brasil pós-leis da Ficha Limpa e da Transparência Pública parece estar trocando a indignação pela ação.
Pode ser ingenuidade política, mas acho que o país está mais participativo e não dirá, como Lula: “Tenho mais o que fazer.”